Por meio do julgamento do Recurso Especial 1.489.562 (Tema 1.338), os ministros do STF, por maioria, definiram que é cabível a ação rescisória contra decisões transitadas em julgado que contrariem a modulação temporal estabelecida no julgamento do RE 574.706 (Tema 69), que tratou da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS.
O Tema 69, amplamente conhecido como a “tese do século”, trouxe grande impacto ao determinar a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS, cuja decisão foi favorável aos contribuintes, que passaram a pleitear a restituição de valores pagos a maior em relação aos últimos 5 anos.
No entanto, com o objetivo de reduzir os prejuízos do erário público, em 13/05/2021, o STF julgou os embargos de declaração que modulou os efeitos da decisão favorável aos contribuintes, estabelecendo que a inconstitucionalidade declarada só teria início a partir de 15 de março de 2017, ressalvadas as ações judiciais já ajuizadas e os pedidos administrativos protocolados até essa data.
Embora a modulação tenha sido julgada em 2021, muitos contribuintes já haviam ajuizado ações entre 2017 e 2021 com base na decisão de mérito do STF que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS. Em razão disso, a União passou a utilizar a ação rescisória como meio de reverter tais decisões judiciais favoráveis aos contribuintes, argumentando que tais decisões, ao garantirem a restituição de valores anteriores a 15 de março de 2017, desrespeitaram a modulação de efeitos fixada pelo STF.
A tese fixada pelo STF foi clara: “Cabe ação rescisória para adequação de julgado à modulação temporal dos efeitos da tese de repercussão geral fixada no julgamento do RE 574.706 (Tema 69/RG)”. Dessa forma, a decisão permite à Fazenda Nacional propor ações rescisórias para anular decisões que concederam direitos a contribuintes fora do período delimitado pela modulação.
Vale ressaltar que essa decisão do STF reforça o entendimento já manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, ao julgar os REsp 2.054.759/RS e 2.066.696/RS (Tema 1245), entendeu pela admissibilidade da ação rescisória, fixando a seguinte tese: “é admissível o ajuizamento de ação rescisória para adequar julgado de antes de 13 de maio de 2021 à modulação do Tema 69 do STF”.
Nesse contexto, a jurisprudência do STF e do STJ se mostra alinhada e complementar, consolidando o entendimento sobre a aplicação da modulação temporal.
O relator do caso no STF, ministro Luís Roberto Barroso, destacou que o cabimento da ação rescisória para corrigir decisões que violam a modulação de efeitos do Tema 69 está relacionado à autoridade da jurisdição constitucional exercida pelo STF. Para o ministro, esse mecanismo é necessário para garantir o respeito às decisões da Suprema Corte e assegurar a uniformidade das decisões em todo o país.
No entanto, essa medida gerou preocupações em relação à segurança jurídica e à coisa julgada. Segundo o voto do ministro Luiz Fux, as decisões judiciais proferidas entre 2017 e 2021 estavam em conformidade com a jurisprudência vigente à época e, portanto, devem ser respeitadas. Para Fux, ao permitir que a Fazenda Nacional utilize a ação rescisória para revisar essas decisões, corre-se o risco de violar o princípio da coisa julgada e de fragilizar a segurança jurídica, pilares fundamentais do Estado de Direito.
Na prática, essa decisão pode abrir precedentes preocupantes, permitindo a anulação de decisões legítimas proferidas por outros tribunais. Isso porque, historicamente, a ação rescisória, prevista para situações excepcionais, pode, com esse entendimento, se tornar um instrumento comum nas disputas tributárias, desequilibrando o sistema e fragilizando a segurança jurídica.
Dessa forma, embora a decisão do STF busque garantir a uniformidade na aplicação do Tema 69, ela representa um risco significativo para a coisa julgada e a segurança jurídica, elementos fundamentais para a previsibilidade e estabilidade das relações jurídicas no Brasil.
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Texto por: Alanna Cavichiolo
Editado por: Luiza Guimarães