SALA DE LEITURA

Triangulação da Demanda Executiva: condenação em honorários

São devidos honorários nos executivos fiscais sem que haja a triangularização da demanda, tendo o Contribuinte realizado o pagamento administrativamente dos créditos tributários executados após o ajuizamento das respectivas execuções, mas sem ter sido devidamente citado no processo executivo? 

A resposta para a questão acima, à luz da jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é: depende!

Depende se a decisão proferida pelo Tribunal local se baseou em precedente do STJ favorável ou desfavorável ao interesse dos recorrentes. O STJ possui precedentes que interessam tanto aos Contribuintes quanto aos Fiscos Municipal e Estadual e, agarrando-se a determinado entendimento, o Tribunal local poderá dar ou negar provimento aos recursos interpostos pelas partes.

E depende também do (in)conformismo das partes, em levar, ou não, a discussão até o Superior Tribunal de Justiça, considerando-se, além do tempo de tramitação dos processos, o custo versus benefício econômico pretendido. No entanto, a resposta não se encerra apenas nesses pontos.

Ao decidirem pela continuidade da discussão, o julgamento favorável ou desfavorável dos Recursos Especiais ou Agravos julgados pelo STJ dependerá da “sorte” na distribuição dos processos para determinados Ministros daquela Corte Superior, em total contrassenso à segurança jurídica. Isso porque, as decisões sobre esse tema sempre foram contraditórias perante o Superior Tribunal de Justiça, oscilando entre julgados favoráveis e desfavoráveis aos interesses das partes proferidos pelas 1ª e 2ª Turmas: 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. QUITAÇÃO DO DÉBITO, NA VIA ADMINISTRATIVA, APÓS O AJUIZAMENTO DA AÇÃO, MAS ANTERIOR À CITAÇÃO DO EXECUTADO. CABIMENTO DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. RECURSO ESPECIAL DO MUNICÍPIO DE CAMARAGIBE/PE A QUE SE DÁ PROVIMENTO.
(…)
(REsp n. 1.931.060/PE, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF5), Primeira Turma, julgado em 14/9/2021, DJe de 23/9/2021) (grifamos)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 03/STJ. EXECUÇÃO FISCAL. EXTINÇÃO DA AÇÃO ANTERIOR À CITAÇÃO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA INDEVIDOS. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
(…)
2. A orientação desta Corte Superior de Justiça, calcada no princípio da causalidade, entende ser incabível a condenação em honorários advocatícios quando a extinção da execução ocorre antes da citação válida em decorrência do pagamento do débito.
(…)
(AgInt no REsp 1.848.573/PE 2019/0341527-2, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 1º/6/2020, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 5/6/2020) (destacamos)

O que se tinha era a 1ª Turma do STJ dando provimento aos Recursos Especiais ou Agravos interpostos pelos Fiscos Estaduais e Municipais, considerando devidos os honorários. E a 2ª Turma do STJ, ora dando provimento aos recursos interpostos pelos Contribuintes, considerando indevidos os honorários, ora negando provimento aos recursos interpostos pelos Contribuintes, considerando devidos os honorários em favor dos Fiscos.

Por um bom tempo, a jurisprudência oscilou dentro da própria 2ª Turma do Superior Tribunal Justiça, até que, por meio do julgamento do RESP de n° 1.927.469/PE, uniformizou-se o entendimento no sentido de serem indevidos os honorários na espécie:

“PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. ARTIGOS 85, §1º, 312 E 318 DO CPC. RECURSO ESPECIAL. PAGAMENTO EM MOMENTO POSTERIOR AO AJUIZAMENTO E ANTERIOR À CITAÇÃO. NÃO CABIMENTO DE CONDENAÇÃO DA PARTE EXECUTADA EM HONORÁRIOS. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

1. O Município de Jaboatão dos Guararapes – PE pretende a condenação da parte executada em honorários em decorrência do pagamento do débito em momento posterior ao ajuizamento e anterior à citação, por aplicação dos §§ 1º e 10 do art. 85 do CPC.
2. Existência de precedentes antagônicos desta Segunda Turma acerca do tema em discussão. Necessidade de uniformização. Precedentes do STJ.
(…)
6. Não cabimento de condenação em honorários da parte executada para pagamento do débito executado em momento posterior ao ajuizamento e anterior à citação, em decorrência da leitura complementar dos princípios da sucumbência e da causalidade, e porque antes da citação não houve a triangularização da demanda.
(…)
9. Recurso especial a que se nega provimento.

(REsp n. 1.927.469/PE, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 10/8/2021, DJe de 13/9/2021)” (grifo nosso)

Assim, reafirmados foram os entendimentos dissonantes entre as 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça, uma vez que a primeira entendia pela condenação em honorários e a segunda entendia pela não condenação. Ambas fundamentando as decisões na aplicação dos princípios da sucumbência e da causalidade.

A partir de então, nas pesquisas realizadas, não se localizou decisão colegiada proferida pela 1ª Seção do STJ, a qual poderia uniformizar o entendimento daquele Superior Tribunal sobre a matéria. Pelo contrário, o que se verifica são inúmeras decisões monocráticas proferidas pelos Ministros do STJ que compõem ambas as Turmas por força da aplicação do disposto no artigo 932, inciso V, do CPC, combinado com os artigos 34, inciso XVIII e 255, do Regimento Interno do STJ, ora negando provimento aos recursos interpostos, ora dando provimento a eles:

“Esta Corte adota o entendimento segundo o qual se revela cabível a condenação do executado, nos casos em que a execução fiscal tenha sido extinta em decorrência do pagamento extrajudicial do crédito tributário, ainda que efetuado antes da citação do contribuinte, em atendimento ao princípio da causalidade e tendo em vista que o pagamento extrajudicial do débito fiscal equivale ao reconhecimento da dívida executada”. (Resp n° 2.068.426/GO (2023/0136773-6) – Relatora: Min. Regina Helena Costa, da 1ª Turma do STJ). (grifo nosso)

A causalidade impede a condenação do contribuinte, mas também da Fazenda Pública em honorários no momento do pagamento anterior à citação e após o ajuizamento”. (Resp n° 2.060.080/GO (2023/0089652-2) – Relator: Min. Francisco Falcão, da 2ª Turma do STJ). (destaque nosso)

E, para complicar ainda mais a questão, a divergência de entendimentos (condenação versus não condenação) também voltou a existir dentro dos próprios julgados proferidos pelos Ministros que compõem a 2ª Turma do STJ, a qual havia uniformizado o entendimento em 2021 no sentido de não serem devidos os respectivos honorários, conforme julgamento proferido no RESP n°1.927.469/PE (destacado mais acima).

Para ilustrar a contrariedade destacada no parágrafo anterior, reproduz-se abaixo duas decisões proferidas monocraticamente por Ministros da 2ª Turma do STJ no dia 24/04/2023, em que a parte recorrente era o Município de Aparecida de Goiânia/GO e os entendimentos firmados pelos Ministros Francisco Falcão e Humberto Martins foram completamente opostos:

RECURSO ESPECIAL Nº 2038121 – GO (2022/0357991-8)
(…)
Cuida-se de recurso especial interposto pelo MUNICÍPIO DE APARECIDA DE GOIÂNIA, com fundamento no art. 105, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS.
O julgado negou provimento ao recurso de agravo interno do recorrente nos termos da seguinte ementa (fl. 68):
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. PAGAMENTO DO DÉBITO ADMINISTRATIVAMENTE. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DA EXECUTADA. NÃO INCIDÊNCIA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Em sede de execução fiscal, efetuado o pagamento da dívida administrativamente, antes de citado o devedor, a extinção do feito não implica a condenação deste ao pagamento de honorários advocatícios. Precedentes do STJ e deste TJGO.

APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(…)
É, no essencial, o relatório.
A irresignação merece prosperar.
Nos termos da jurisprudência desta Corte, é cabível a condenação do executado nos casos em que a execução fiscal tenha sido extinta em decorrência do pagamento extrajudicial do crédito tributário, ainda que efetuado antes da citação do contribuinte, em atendimento ao princípio da causalidade e tendo em vista que o pagamento extrajudicial do débito fiscal equivale ao reconhecimento da dívida executada.

A propósito, cito:
(…)
Nesse cenário, impõe-se a reforma do acórdão recorrido por contrariar a jurisprudência dominante desta Corte.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para, reformando o acórdão recorrido, reconhecer devida a condenação em honorários advocatícios postulada pelo recorrente e determinar o retorno dos autos, a fim de que o Tribunal de origem fixe a verba honorária como entender de direito.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 20 de abril de 2023.

Ministro Relator HUMBERTO MARTINS

(REsp n. 2.038.121, Ministro Humberto Martins, DJe de 24/04/2023) (destaque nosso)

RECURSO ESPECIAL Nº 2060080 – GO (2023/0089652-2)
(…)
Trata-se de recurso especial interposto por MUNICÍPIO DE APARECIDA DE GOIÂNIA, com fundamento no art. 105, III, da Constituição Federal, contra acórdão assim ementado:
(…) QUITAÇÃO DO DÉBITO ADMINISTRATIVAMENTE. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DA EXECUTADA. RELAÇÃO PROCESSUAL NÃO APERFEIÇOADA. NÃO INCIDÊNCIA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA MANTIDA.
(…)
2. De acordo com precedentes do STJ e desta Corte Estadual, quitado o débito na via administrativa e, não tendo ocorrido a citação válida do devedor, incabível a condenação deste ao pagamento da verba honorária.

APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA EM PARTE E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDA.

No presente recurso especial, o recorrente apontou violação de dispositivos de lei federal.

É o relatório. Decido.

Não assiste razão ao recorrente. A causalidade impede a condenação do contribuinte, mas também da Fazenda Pública em honorários no momento do pagamento anterior à citação e após o ajuizamento. Sobre o assunto, confiram-se:
(…)
Ante o exposto, com fundamento no art. 255, § 4º, II, do RISTJ, nego provimento ao recurso especial.
Publique-se. Intimem-se..
Brasília, 19 de abril de 2023.
Ministro Relator FRANCISCO FALCÃO
(REsp n. 2.060.080, Ministro Francisco Falcão, DJe de 24/04/2023). (grifo nosso)

Como se viu, no primeiro caso, o Ministro Humberto Martins deu provimento ao recurso interposto pelo Município de Aparecida de Goiânia/GO para reformar a decisão proferida pelo Tribunal de Goiás que entendeu pela não condenação do executado ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Fisco.

Por outro lado, no segundo caso, o Mininistro Francisco Falcão negou provimento ao recurso interposto pelo Município de Aparecida de Goiânia/GO, para manter a decisão proferida pelo Tribunal de Goiás. Esta decisão entendeu pela não condenação do executado ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Fisco.

As decisões conflitantes entre Ministros da 2ª Turma não se restringem apenas aos casos acima destacados, basta observamos a decisão monocrática proferida pelo Ministro Herman Benjamin em 23/03/2023 no julgamento do RESP n° 2.055.055 – GO (2023/0056768-1), a qual deu provimento ao recurso especial também interposto pelo Município de Aparecida de Goiânia/GO, condenando o executado em honorários. E a decisão monocrática proferida em 15/03/2023 pela Ministra Assusete Magalhães no julgamento do RESP n° 2.050.200/ES (2023/0029123-2), a qual negou provimento ao recurso especial interposto pelo Município de Vitória/ES, afastando a condenação do executado em honorários.

Assim, o que se conclui é que, a depender do real interesse das partes na causa, bem como da “sorte” na distribuição do Recurso Especial ou Agravo no STJ, os executados poderão ser, ou não, condenados ao pagamento de honorários advocatícios sem que haja a triangularização da demanda executiva, na hipótese de pagamento administrativo dos créditos tributários após o ajuizamento do executivo fiscal, em total contrassenso à segurança jurídica tanto almejada.

*Artigo por: Gabriel Reis de Andrade Meister
*Editado por: Luiza Guimarães

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