SALA DE LEITURA

B Corps: Certificação e Aspectos Jurídicos

O presente artigo é o segundo de uma série de três textos sobre o movimento B no Brasil. No primeiro artigo da série, publicado em nossa sala de leitura, no dia 05/05/2023, tive a oportunidade de explicar o que são as chamadas B Corps, e contar um pouco mais sobre o movimento B no Brasil. No segundo artigo, publicado há algumas semanas, expliquei brevemente como o Sistema B no Brasil pode ser uma ferramenta eficaz para a promoção do desenvolvimento nacional sustentável.

Mas o que preciso fazer para que minha empresa seja considerada uma B Corp? Como é feita essa certificação? Preciso fazer uma transformação da minha Sociedade. O que o Direito brasileiro diz? São esses questionamentos que buscaremos responder com o presente artigo.

Como já afirmado nos artigos anteriores, o Sistema B é um movimento global de negócio de impacto que ressignificou a receita capitalista na economia e “busca uma nova ‘genética’ econômica que permita que os valores e a ética inspirem soluções coletivas, sem esquecer das necessidades particulares”. A missão do movimento é “construir um ecossistema favorável para fortalecer empresas que usam a força do mercado para solucionar problemas sociais e ambientais”. A gestão baseada no impacto é, pois, composta por uma nova genética: o sucesso está ligado ao bem-estar das pessoas e do planeta. O lucro deixa de ser objetivo principal e passa a ser consequência.

Nesse sentido, o movimento B defende que os negócios devam ter um propósito maior, tratar todos os stakeholders de forma equânime, gerar cultura e criar valores que garantam a sua perpetuidade. As empresas não devem apenas entregar valor aos acionistas, mas também às partes interessadas, como funcionários, comunidades e meio ambiente. Ou seja, acredita em um capitalismo que é capaz de fomentar tanto o bem econômico quanto social e ambiental, acarretando, conjuntamente, resultados benéficos aos negócios e à sociedade (“Capitalismo de Stakeholders”).

As Empresas B medem seus impactos sociais e ambientais e se comprometem de maneira pessoal, institucional e legal a tomarem decisões considerando as consequências de suas ações a longo prazo dentro das comunidades e no meio-ambiente. Assumem a responsabilidade de pertencerem ao movimento global de empresas que buscam a mudança do mundo utilizando a força do mercado como solução para problemas sociais e ambientais. 

Dessa forma, a Certificação como Empresa B demanda um alto grau de comprometimento e dedicação das corporações em todo o processo, pois os negócios precisam ter práticas, políticas e processos consolidados para fazer jus à certificação. Em razão disso, não é possível certificar empresas que possuam menos de um ano de atividade, uma vez que neste período ainda não há padrões operacionais e culturais suficientemente estabelecidos ou consolidados, tampouco resultados significativos a serem mensurados.

Fundamentado no lema “novos tempos exigem novas formas de fazer negócios”, o Sistema B avalia o sucesso das empresas através da sua contribuição para o desenvolvimento sustentável de toda a sociedade e o planeta. Mas de que forma tal sucesso é mensurado? As ferramentas e métricas estabelecidas pelo B Lab podem ajudar todas as empresas – não apenas Empresas B – a fazer essa transição para uma estrutura de gestão mais socioambiental responsável.

A Certificação B Corp não avalia apenas um produto ou serviço, mas é a única certificação que avalia o impacto geral positivo de uma empresa – em todas as suas áreas – e mede o seu desempenho social e ambiental. A Avaliação de Impacto B analisa a forma como as operações da empresa e o seu modelo de negócio impacta os trabalhadores, comunidade, meio ambiente e clientes, desde os fornecedores e matérias-primas até às doações de solidariedade e benefícios para funcionários, seguindo os mais altos padrões de desempenho. O processo de certificação segue um passo a passo, iniciando-se pelo cumprimento de alguns requisitos, como: ser uma entidade com fins lucrativos; possuir mais de 12 meses de operação e operar em mercados competitivos, estando expostas aos riscos normais de qualquer empresa, como seus concorrentes, impostos e mudanças comerciais. O segundo passo corresponde a se submeter a uma avaliação do verdadeiro valor que a empresa gera na sociedade, através da ferramenta “Avaliação de impacto B – BIA”, de modo que somente com a obtenção de uma pontuação de pelo menos 80 dos 200 pontos no teste, a empresa poderá ser validada pelo B Lab. Além de avaliadas pela ferramenta BIA, são verificadas, auditadas e certificadas por especialistas do B Lab. Após a validação da B Lab, a empresa poderá assinar a Declaração de Interdependência B Corp e passar a ser certificada como uma Empresa B, ficando comprometida a operar com altos padrões de transparência, além de aprimorar continuamente a sua gestão e mensuração de impacto.

O certificado permite que as empresas possam não só declarar que são sustentáveis e éticas, como comprovar o seu engajamento com esses valores e práticas, por meio de uma organização certificadora independente.

Além disso, todas as Empresas B se comprometem, em até 12 meses após a obtenção da sua Certificação, a incluir em seu ato constitutivo/contrato social/estatuto social, determinadas cláusulas específicas – chamadas Cláusulas  B – as quais asseguram o compromisso do negócio de atuar para além de interesses puramente financeiros e econômicos na tomada de decisões estratégicas, protegendo sua missão e estabelecendo responsabilidades sobre questões sociais e ambientais atreladas à sua operação.

Vê-se, pois, que qualquer empresa, desde que satisfeitos os requisitos acima mencionados, poderá vir a ser um Empresa B Certificada, independentemente de sua natureza jurídico-societária. 

Em que pese à relevância do tema, o direito brasileiro – sobretudo no tocante às normas societárias – ainda não regulamentou o tema, carecendo o Sistema B de uma legislação específica que o regule. Nos Estados Unidos, em relação às B Corps, o direito americano tem reconhecido a responsabilidade fiduciária da empresa com o compromisso pela maximização de retorno dos acionistas, mesmo que em detrimento de outras partes interessadas, como a própria comunidade. Para mudar este paradigma e incluir o impacto socioambiental no mesmo patamar do lucro, o Movimento B defende a criação de um novo tipo jurídico de corporação no mundo: a Benefit Corporation, para equiparar o axiologicamente o impacto social nas tomadas de decisão ao valor da maximização dos lucros aos investidores e acionistas. Em abril de 2010, o estado de Maryland foi o primeiro a assinar a legislação de Benefit Corporation. Em julho de 2013, a legislação já havia sido aprovada em 19 estados dos Estados Unidos, inclusive em Delaware, estado que abriga mais da metade das empresas de capital aberto do país.

Na América Latina ainda não existe um marco legal que regule os direitos e obrigações, deveres e garantias desse novo ator social no mercado, as Empresas B, como acontece com as Benefit Corporations nos Estados Unidos. Empresários enfrentam um dilema na hora de definir o tipo de empresa na hora de gerar um material impacto positivo na sociedade, e essa lacuna legislativa acaba por desestimular investidores diante da insegurança jurídica.

Embora não se trate, pois, de um novo tipo societário, e careça, ainda, de maior regulamentação jurídica, é certo que o movimento B é uma realidade e chegou para ficar. O compromisso assumido com a sustentabilidade em seus documentos societários tem sido, ao menos até o momento, ferramenta suficientemente transformadora da cultura da Sociedade e vinculante aos interesses da Companhia, de seus shareholders e às atividades realizadas pelos seus dirigentes, fundamentando as tomadas de decisões não mais puramente pela maximização dos lucros, mas, inclusive, à promoção do desenvolvimento sustentável.

Ao contrário daqueles que acreditam que a sustentabilidade é uma tendência passageira, a Deloitte afirmou que a sustentabilidade é um problema empresarial de suma importância que, com uma rapidez exponencial, está se transformando em um requisito obrigatório. A Deloitte também argumentou que a responsabilidade socioambiental vai continuar sendo relevante porque, ao contrário de outros problemas empresariais, a sustentabilidade está sendo moldada por grupos com opinião similar, como acionistas, reguladores, consumidores e clientes, organizações não governamentais e outros fatores fora do escopo de controle de uma empresa.

Artigo por: Maxwell Lima Dias
Edição: Luiza Guimarães

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